Em atividade desde 1972, a Banda de Pau e Corda é um dos grupos mais longínquos da música popular brasileira. Integrante de um movimento de renovação da sonoridade criada no Nordeste que tinha como epicentro o Recife, o grupo foi responsável, junto a nomes como Quinteto Violado, Geraldo Azevedo e Alceu Valença, por criar uma canção popular urbana com características marcadamente nordestinas. E fez disso a sua missão. Após quase 30 anos sem entrar em estúdio para gravar um trabalho solo, o grupo lança neste sexta-feira (23) um novo álbum. “Missão do Cantador”, título que dá nome ao álbum e também à sua faixa de abertura, marca uma espécie de retorno da Banda de Pau e Corda em sua essência. O álbum sai pela Biscoito Fino, com produção assinada por José Milton e capa de Elifas Andreato.
Apesar das mudanças em sua formação original, o grupo se mantém fiel à sonoridade que o colocou no rol dos clássicos da música popular brasileira. O diálogo entre a flauta e a viola, os vocais sempre presentes e, sobretudo, a maestria de sua “poesia cantada” – como frisou Gilberto Freyre ainda no primeiro disco do grupo -, estão presentes nesse novo trabalho. Para isso, o grupo contou com a produção de José Milton, responsável por lançar, ainda em 1973, o grupo no mercado fonográfico. Profissional de longa e importante história na MPB, José Milton iniciou sua trajetória como produtor musical justamente com a Banda de Pau e Corda, e com ela seguiu caminhando junto nos primeiros 7 álbuns.
Os arranjos são, em sua maioria, assinados por Zé Freire, também violonista do grupo. Das 13 canções que integram o trabalho, apenas 2 possuem assinatura de Waltinho, um dos fundadores da Banda e arranjador de todos os trabalhos anteriores. Inspirado na estética definida por Waltinho ao longo de décadas, Zé Freire criou os demais arranjos tentando construir pontes entre o passado e o presente, respeitando toda a história da Banda de Pau e Corda, mas apontando caminhos futuros. E esse diálogo entre gerações também se faz notar na escolha das participações especiais. Na parte instrumental, o Mestre Gennaro participou tocando sanfona na canção Estrela Cadente (Waltinho/Sérgio Andrade) e Alexandre Rodrigues, também conhecido como Copinha, tocou pífano na música Fogo de Braseiro (Sérgio Andrade), cujo arranjo dialoga diretamente com o clássico “A briga do cachorro com a onça”, composição de Sebastião Biano, da Banda de Pífanos de Caruaru. A mesma canção conta também com a participação especial do paraibano Chico César. “Além de ser um artista de quem somos fãs, Fogo de Braseiro é uma letra com forte teor político e Chico é um dos artistas que melhor consegue traduzir isso em suas canções”, destaca Sérgio Andrade, cantor, compositor e um dos fundadores da Banda.
Outro artista convidado a participar foi o maranhense Zeca Baleiro. Com interpretação marcante, Zeca divide os vocais com a Banda de Pau e Corda na canção Tudo Num Balaio Só, música inédita de autoria de Murilo Antunes em parceria com Natan Marques. “Quando Murilo me apresentou essa música, a primeira voz que eu imaginei foi a de Zeca Baleiro. Antes mesmo de me imaginar cantando a canção, eu só conseguia ouvir a voz de Zeca”, revela Andrade. Para fechar a lista de participações, a Banda de Pau e Corda convidou o cantor Marcello Rangel, integrante da nova cena da música pernambucana reunida no movimento Reverbo, para gravar voz e violão no frevo “Quer Mais o Quê?”, de sua autoria. A canção foi apresentada à Banda pelo autor no finalzinho de 2019 e imediatamente adotada pelo grupo já no carnaval de 2020.
A capa do álbum “Missão do Cantador”, assinada pelo artista plástico Elifas Andreato, reedita uma parceria que teve início nos anos 1970. Mais especificamente em 1978, quanto Elifas criou uma das obras mais icônicas de sua extensa e premiada carreira: o LP Arruar, da Banda de Pau e Corda, que é um marco na trajetória do artista e também do grupo. Trazendo sobre o fundo preto uma caveira de boi crucificada, o artista conseguiu transmitir com excelência a mensagem que a Banda levava em suas canções. Sobre o mesmo fundo preto, saem as imagens da seca, entram as cores de um nordeste contemporâneo.
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